segunda-feira, 31 de maio de 2010

“PERDEMOS UM BOCADO A NOSSA FILOSOFIA QUE SEMPRE FOI SERMOS MUITO GENUÍNOS”


O cinema português na visão de um actor formado pela Escola de Superior de Artes do Porto (ESAP)

Quando se pensa em cinema, pensa-se em realização, em produção e argumento. Descura-se, muitas vezes, o lado da representação, o núcleo dos actores que transportam a história do papel para o movimento. Luís Trigo é um jovem actor, com carreira já no teatro e no cinema, que avalia muito negativamente o que se faz neste momento por cá.

“O cinema português está muito mal, porque dá-se dinheiro a gente que não tem qualidade e menos às pessoas que a têm.”

Luís Trigo queixa-se de que os actores portugueses têm falta de oportunidades de emprego, e que apesar de terem qualidade, não a vêem reconhecida.

Na óptica do actor, o cinema de agora é marcado, claramente, pelo sensacionalismo e pelo ‘comercialismo puro’.

“Queremos ser como os americanos e perdemos um bocado a nossa filosofia que sempre foi sermos muito genuínos. Não estou a dizer que copiar é mau, mas ao menos que saibamos copiar.”
Em relação ao trabalho enquanto actor, já participou, profissionalmente, numa longa-metragem: o “Cônsul de Bordéus”. Em relação às áreas do cinema e teatro, acrescenta que “as diferenças é que no cinema o cenário é natural e no palco é fictício. De resto a representação tem de lá estar e o sentimento também.”

Quando pensou em ser actor, não pensou em cinema nem teatro, mas ,sim, em publicidade na televisão, porque, afirma, “foi sempre uma área que me fascinou”. Mas, ao tirar o curso de teatro, este ganhou uma dimensão enorme na sua vida, o que só veio provar que "o teatro é importante em tudo na vida, até a nível social". “O teatro funcionou como uma escola de controlo de emoções para sermos mais genuínos e verdadeiros connosco próprios. Aproveitei a representação para aprender a viver.”

Quanto à questão das dificuldades em ser actor, em Portugal, nos dias de hoje, pode apontar-se, desde já, a distinção entre cinema e teatro, tendo os primeiros mais privilégios e regalias em comparação com os do segundo meio.

Para Luís Trigo, os actores são escolhidos pelas caras e não pelos talentos. Também se gasta imenso dinheiro, com pequenas produções, porque querem contratar grandes actores e colaboradores, e ter grandes cenários.

“Há poucos apoios para os jovens
e muitos para as pessoas mais conhecidas como, por exemplo, Manoel de Oliveira. A minha sugestão era gastar-se menos dinheiro e o filme tinha a mesma qualidade, se se apostasse na qualidade em vez de na quantidade”, afirma Luís.A preocupação com a aparência, a tentativa de americanizar o cinema português, leva a que se descure a história, o argumento. O filme português torna-se, assim, muito intelectual: desde a sua aparência – “mais escura” e “menos nítida” – até ao som, como explica Luís.

“Acho que os jovens artistas são pouco apoiados em Portugal - há os que têm valor e os que não têm – e se calhar tem de haver uma selecção mais rígida. Enquanto não se lutar por uma carteira profissional de actor, vai continuar a haver gente que só tem a imagem a seu favor contra pessoas que, poderiam desempenhar melhor os papeis mas que, por não serem tão bonitas, não têm essa possibilidade.”


Pode então dizer-se que no cinema português, nos dias de hoje, se consome mais aparência em quantidade do que qualidade.

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